Toda a nossa experiência auditiva está voltada à identificação
dos sons. Um miado de gato, uma torneira pingando e a voz das pessoas. Estamos
muito mais interessados na natureza do som do que no lugar de onde ele vem. Os
sons se afunilam ao entrar em nosso sistema auditivo, é como se a natureza
jogasse fora a oportunidade de localização do som e temos que nos preocupar com
isto observando, a partir de agora, de onde vêm os elementos sonoros que
estamos ouvindo: da direito, da esquerda, do chão, do alto. Os animais fazem
essa localização com muito mais freqüência e naturalidade. Observe um gato, ao
ouvir e pressentir outro animal, movimenta suas orelhas a fim de calibrar sua
audição. Isso significa que, com o passar dos milênios, perdemos a mobilidade
de nossas orelhas, deixando de identificar, por exemplo, a presença de um
violino à esquerda, de um baixo à direita, de sopros ao fundo quando assistimos
a uma orquestra.
Mesmo perdendo um pouco desta mobilidade auditiva não somos tão ineficientes na
localização dos sons. No entanto, as corujas são as campeãs, observam suas
caças auditivamente com uma margem de erro ínfimo.
Ressonadores Vocais e os Órgãos Articuladores
O som produzido na laringe seria praticamente inaudível se não
fosse amplificado e modificado pelas caixas de ressonância próximas à laringe.
Para a técnica vocal (o canto), daremos especial atenção aos ressonadores da
face. São eles: cavidade da boca, cavidades do nariz e os seios paranasais,
chamando-os de ressonadores faciais ou voz facial. É esta voz facial que o
cantor, seja qual for sua voz, deve e precisa desenvolver. Uma voz que não
explora essas ressonâncias, mesmo sendo uma voz forte, será uma voz sem brilho
e sem qualidade sonora. A voz bem colocada tem penetração, beleza e qualidade.
A voz não impostada, não trabalhada, geralmente é apoiada na garganta,
emitindo, assim, sons imperfeitos, sem brilho, mesmo que o timbre seja muito
bonito e agradável.
Você já deve ter ouvido falar em “cantar na máscara”, ou seja, utilizar os
ressonadores faciais. Observe os ressonadores faciais fazendo este simples
teste: coloque uma das mãos encostadas no “Pomo de Adão”, que é a saliência da
laringe e a outra entre o lábio superior e o nariz, apenas encoste a mão. Não
faça força nem aperte. Com a boca fechada produza um som qualquer, como um
“HUM”. Se observar uma vibração no “Pomo” você está apoiando a voz na garganta
e não nos ressonadores faciais, caso a vibração maior seja abaixo do nariz você
estará no caminho certo, utilizando esses ressonadores faciais. Não se
preocupe, faremos outros exercícios para tal desenvolvimento.
Uma voz que não utiliza os ressonadores faciais tende a provocar um desgaste
obrigando o cantor a um esforço desnecessário e, sem dúvida, sua voz será
envelhecida prematuramente.
Impor a voz na face não significa forçá-la nos ressonadores faciais com
excessos de emissão e sim emiti-la de forma fisiológica sabendo explorá-la de
maneira natural.
Os órgãos articuladores são: os lábios, os dentes, a língua, o palato duro, o
véu palatar e a mandíbula e são encarregados de transformar a voz em voz falada
ou cantada. Qualquer deficiência de articulação irá dificultar o entendimento
do que se canta.
É importantíssimo saber pronunciar bem as palavras de acordo com o idioma e
suas regras, explorando os articuladores na forma correta dos vocábulos. A
cavidade bucal sofre diversas alterações de tamanho e forma pelos movimentos da
língua, considerada como o principal órgão da articulação, pois apresenta uma
enorme variabilidade de movimentos pela ação dos seus músculos.
Abertura da Garganta
Quando comemos alguma coisa que está muito quente,
instintivamente abrimos a boca aumentando o espaço interno dela para que a
língua e o palato, céu-da-boca, fiquem o mais afastado possível desse alimento
quente, então, quando bocejamos, a língua desce e o palato mole se eleva.
Para entendermos melhor vamos fazer uma experiência?
Vá até o espelho, de preferência o de seu toalete pois deve ser bem iluminado,
abra bem a boca e repare no posicionamento da língua e do palato mole (ele está
ligado à úvula, mais conhecida como campainha, e quando esta sobe eleva o
palato mole junto). Repare o movimento da língua e do palato mole.
Ouve um aumento considerável do espaço interno da boca, não é?
Posição da boca
É necessário que se abra a boca para que o som seja projetado
melhor, repare os cantores de que você mais gosta, mesmo com estilos
diferentes, todos abrem bem a boca para cantar.
O maxilar deverá estar bem relaxado procurando não projetá-lo para frente ou
para os lados, a língua deverá ser mantida na maior parte do tempo abaixada e
relaxada.
Comentários sobre as causas dos erros da
técnica
e sobre suas conseqüências:
As causas que levam aos erros de técnica são
extremamente variadas. Dependendo das pessoas, elas podem alterar, mais ou
menos gravemente, as características do timbre, assim como os órgãos vocais, e
modificar o gesto respiratório.
As principais causas são:
1 - A falta das noções elementares das leis que regulam a função
respiratória e vocal. Daí advêm os erros de técnica que culminam nas anomalias
importantes do gesto vocal.
2 - Os métodos empíricos baseados sobre uma experiência pessoal ou na pesquisa
de um timbre particular, imposto por um professor de canto e que não
corresponde à voz natural do cantor, nem a sua conformação, nem às suas
possibilidades.
3 - A classificação prematura, o erro de classificação ou a desclassificação
voluntária, razões estas que maltratam a voz, que a cansam excessivamente ou a
deterioram.
4 - O uso da voz profissional antes que a técnica esteja corretamente
assimilada ou que a interpretação dos papéis não corresponda às possibilidades
do cantor.
A prática do canto coral, amador ou profissional o que favorece o maltrato e o
cansaço excessivo, principalmente se a pessoa está usando sua voz numa
classificação errada.
5 - O maltrato vocal, trata-se de uma intoxicação lenta e progressiva que se
instala insidiosamente e intervém após um excesso de trabalho. Encontra-se
isto, particularmente naqueles que procuram um hipertimbre. No início não há
lesão, mas as alterações das cordas vocais aparecem depressa e aumentam com o
tempo. Concomitantemente, há hipersecreção e pigarros e as cordas vocais
tornam-se rosadas, depois vermelhas e deformadas. Estas perturbações aparecem,
geralmente, nos cantores que não se preocupam com a respiração, ou quando esta
se encontra mal-adaptada. Também naqueles que recebem orientações errôneas, nos
que são mal e/ou prematuramente classificados. Enfim, quando há uma má higiene
vocal e geral.
A fadiga vocal excessiva é a conseqüência de esforços prolongados tais como:
notas sustentadas muito tempo, abuso de notas agudas, ou trabalhar a voz quando
há rouquidão. As cordas vocais ficam vermelhas assim como os órgãos vizinhos.
As modificações da forma das cordas vocais e de sua tensão aparecem logo
depois.Tanto para o maltrato como para a fadiga excessiva, a musculatura perde
sua agilidade e sua resistência. Segue-se uma diminuição do rendimento vocal,
assim como modificações das particularidades acústicas do timbre que podem ir
da voz velada à mais discreta chegando à rouquidão persistente e às deformações
das cordas vocais, portanto a uma incoordenação entre o trabalho dos órgãos
vocais e respiratórios.
Estas diferentes causas terão repercussões sobre a respiração, seja por que a
maneira imposta de respirar não é fisiológica, seja por que o cantor tem
dificuldades próprias.
Eis aqui as mais importantes causas destas
dificuldades.
A respiração invertida. O ar é tomado na parte superior do tórax e determina
esforços no nível dos ombros, do pescoço e dos músculos laríngeos. Durante a
fonação, o ventre se contrai, se imobiliza, é o bloqueio diafragmático, o que
torna impossível os movimentos naturais deste músculo. A voz é áspera por falta
de agilidade da musculatura respiratória.
Os movimentos respiratórios exagerados são acompanhados por uma capacidade
respiratória muito grande, por uma dilatação exagerada dos alvéolos pulmonares,
podendo provocar o enfisema e fazendo com que a voz se eleve muito. Com
freqüência ao emitir notas agudas, o cantor eleva toda a parte superior da
caixa torácica e inspira o máximo de ar. Ele confunde capacidade e pressão.
A rigidez muscular tem como conseqüência uma capacidade insuficiente e
impossibilita a adaptação do gesto respiratório ao da emissão, devido à
ausência do jogo diafragmático.
A respiração costal-superior nos dois tempos da respiração. Somente a parte
superior da caixa torácica mexe. Este modo de respirar tem como conseqüência
uma hipertonia da musculatura abdominal, que nos momentos de forte intensidade
ou no extremo agudo é obrigada a um acréscimo de trabalho.
A abertura exagerada das costelas sobre as quais o cantor toma apoio. Isto
limita a possibilidade de movimento da cinta abdominal bem como sua agilidade.
Os movimentos da parede abdominal são muito exagerados e são feitos em
detrimento da abertura lateral das costelas e do trabalho da musculatura
dorso-lombar. Ou encontramos contração, somente no nível da cavidade
epigástrica, por falta de tonicidade do grande reto, ou a parte superior deste
músculo é empurrada para a frente no momento da fonação.
O trabalho do grande reto é mal compreendido. Ao invés de relaxar na
inspiração, ao mesmo tempo que a parede do abdômen, ele se contrai e é
empurrada para a frente, o que limita os movimentos abdominais.
A falta de tonicidade da cinta abdominal que não pode, desta forma, desempenhar
seu papel de sustentação. A voz é velada e lhe falta intensidade. A inspiração
é normal, mas o ventre é empurrado para a frente durante o canto.
Os movimentos inspiratórios são desproporcionais e não estão relacionados com a
quantidade de ar inspirado. Neste caso, a capacidade pode ser insuficiente ou
exagerada.
Na maioria dos casos, as imperfeições do gesto respiratório impedem ou limitam
a subida do diafragma. Decorrem disto, esforços de compensação, especialmente
no pescoço, nos órgãos laríngeos e peri-laríngeos. Fica difícil regular e
sustentar a respiração em função das exigências da música, o que leva mais ou
menos rapidamente aos problemas de emissão devidos a um trabalho mal
distribuído, excessivo ou insuficiente, conforme cada caso. A laringe fica prejudicada
nos seus movimentos naturais, a faringe modifica seu volume, as cordas vocais
coaptam demais ou de modo insuficiente, daí se seguem as alterações do timbre,
as modificações da duração, da intensidade e da altura tonal.
No que diz respeito à articulação, as dificuldades observadas, geralmente
decorrem de orientações errôneas, por desconhecimento das regras da fonética,
de emissões que utilizam atitudes anormais determinando uma rigidez muscular,
ou pela falta de tonicidade.É preciso impedir: a abertura da boca em altura na
maioria das sílabas (o que abafa a voz e deforma a articulação), a posição
transversal exagerada dos lábios, de modo pouco estético e pouco habitual. E,
ainda, evitar a rigidez da mandíbula, a expressão crispada do rosto, os movimentos
inexatos da língua e o tremor a que ela é submetida nos agudos, às vezes mesmo
em toda a extensão vocal. Este defeito muito difundido, indica uma sonoridade
que não encontrou seu lugar, que mexe com cavidades mal-adaptadas ao som da
laringe e, sobretudo, a um sopro mal direcionado ou, ainda, a um excesso de
pressão. Isto começa com um tremor regular associado a um vibrato exagerado que
pode levar à voz caprina.Freqüentemente ressaltamos ao longo deste trabalho, -
dada sua interação com os órgãos circunvizinhos -, a importância dos movimentos
articulatórios, pois é por seu intermédio que as sonoridades vocais são criadas
e que certos problemas de timbre podem ser corrigidos.É evidente que todo
cantor, que deseje ser compreendido, deveria respeitar certos princípios. Se os
oradores cometessem os mesmos erros, utilizassem as mesmas deformações da
articulação que observamos em alguns cantores, eles também não seriam
compreendidos. Algumas pessoas argumentarão que a voz cantada exige movimentos
e tensões mais desenvolvidas que a voz falada. Mas, já que existem cantores
dotados de uma voz poderosa cujo texto é percebido inteiramente e atravessa a
ribalta, por que não deveria ser igual para os outros? É normal escutar certos
cantores e não saber em que idioma eles cantam?
Temos que observar atentamente as posições da laringe, localizada muito em cima
ou muito embaixo em relação à altura tonal. Nestas condições é fácil imaginar o
esforço pedido à toda a musculatura circunvizinha para impedir a laringe de
executar os movimentos de ascenso ou descenso e o incômodo imposto à
articulação.
A posição muito baixa da laringe pode ser conseqüência de uma má-adaptação do
bocejo. Este procedimento pode ser utilizado, pois bocejar nos permite tomar
consciência de que os pilares, o véu palatino, assim como a parede faríngea
estão em tensão muscular e provocam o alargamento transversal das cavidades de
ressonância. Ele não é ineficaz nem perigoso, desde que se leve em conta que
bocejar exige uma enorme tensão da musculatura, a ponde de provocar,
simultaneamente, um recuo da língua em direção à hipo-faringe o que impõe o
abaixamento da laringe e impede os movimentos destes dois órgãos (figura 30).
Podemos pensar no bocejo quando se trata da musculatura velo-faríngea, isto
pode ser útil em alguns casos, desde que isto não impeça a mobilidade da língua
e da laringe.Podemos observar cantores cuja laringe está sempre posicionada
muito em cima e desta forma há falta de flexibilidade. Nesta atitude excessiva,
a base da língua se eleva e se contrai exageradamente contra o véu palatino, o
que diminui o volume da cavidade faríngea.
Estas duas posições extremas são muito usadas como base da técnica do canto.
Elas são anti-fisiológicas, por que impõem ao mesmo tempo uma coaptação
excessiva das cordas vocais, uma modificação do timbre, uma pressão expiratória
intensificada demais, assim como uma má união faringo-laríngea.
No que diz respeito à emissão vocal, devemos abolir tudo aquilo que incomodará
ou impedirá a acomodação das cavidades supra-laríngeas ao som emitido pela
laringe:
buscar um timbre específico, muito claro ou muito sombrio, o exagero das
ressonâncias guturais, palatais, faríngeas e nasais, indica sempre, uma péssima
distribuição das zonas de ressonância.
o esforço para colocar a voz na frente, mesmo nos momentos de grande potência -
o que incita a empurrar - quando todos os fenômenos acústicos são
experimentados no interior dos órgãos.
a voz na máscara ou sobre os lábios.
o abuso de certos apoios que representam esforços excessivos.
cantar muito alto ou baixo demais, muito grave ou muito agudo em relação às
possibilidades naturais. Insistir demais sobre notas agudas ou em passagens
extensas.
inclinar a cabeça para frente, o que impede os movimentos laríngeos e indicam a
pesquisa da voz na parte anterior da cabeça.
o “golpe de glote” ou tomada da nota por baixo que resulta da falta de
sincronização entre a pressão sub-glótica e a postura das cavidades
faringo-laríngeas.
treinamento vocal sempre na mesma vogal.
abuso da voz de cabeça que, não sustentada pode levar à voz de falsete.
uso abusivo do portamento o que indica a falta de sinergia entre os órgãos
vocais e respiratórios.
Todas estas pesquisas ou abusos do gesto vocal vão determinar, principalmente,
um comportamento de esforço que terá conseqüência sobre o timbre da voz.
Serão alterações tais como:
A voz estridente, que é o resultado de uma voz clara demais, exageradamente
brilhante e localizada na frente. O cantor força sua laringe que está muito no
alto. Suas cordas vocais coaptam fortemente, a língua contraída recua em
direção ao véu palatino, este último participando também do esforço. Os
ressonadores estão contraídos e seu volume diminuído. Pouco a pouco surgem as
dificuldades nas notas graves, mas principalmente nas agudas, assim como nos
sons ligados e nos sons ppp.
A voz obscurecida é uma voz que comporta muitos harmônicos graves. A laringe se
fecha mal, falta firmeza aos ressonadores assim como para os órgãos
articulatórios. Desta forma, a voz não chega aos ressonadores e não tem chance.
O gasto de ar é excessivo, a articulação é indiferenciada, incompreensível, há
falta de clareza na articulação das vogais e consoantes.
A voz gutural; nela a respiração é rígida e fornece um excesso de pressão. A
faringe está contraída na sua totalidade. A língua apoiada atrás atrapalha os
movimentos naturais da articulação, assim como os da laringe.
A rouquidão passageira. Se após meia hora de canto, a voz falada enrouquecer,
isto indica uma classificação errônea, cansaço vocal devido aos esforços
vocais, maltrato por ter cantado enquanto jovem demais ou durante muito tempo
seguido, uma técnica mal assimilada ou, ainda, quando o cantor canta partes
muito difíceis para ele.
A voz velada pode ser um problema passageiro ou permanente. É o resultado do
funcionamento defeituoso dos órgãos vocais e respiratórios que podem levar à
uma falta de tensão das cordas vocais. É uma voz despojada de harmônicos
agudos.
A voz branca, fraca, sem timbre, indicando não somente uma pressão expiratória
insuficiente, mas também uma falta de tonicidade da cavidade faringo-laríngea.
A língua achatada e mole obriga a laringe à uma posição muito baixa.
Falta de homogeneidade na voz. Se caracteriza por zonas destimbradas. As vogais
claras são estridentes, as abertas estão engrossadas e as nasais nasalizadas
demais. Ainda se constata a existência de passagens, de falhas na voz, das
fífias e dificuldades para os sons ligados e semi-tons.
A voz caprina é sempre o resultado, mais ou menos rápido, de uma emissão
forçada, uma respiração mal dosada, um mal direcionamento do sopro, ou seja,
uma técnica defeituosa. Ela acontece num dado momento quando o cantor não
consegue mais manter o esforço. O resultado é uma espécie de tremor muscular
que se propaga a todos os órgãos, movimentos convulsivos da mandíbula, da
língua, do queixo, da úvula, perceptíveis à visão e à audição. Há uma variação
de altura e intensidade.
A diminuição da intensidade, as dificuldades com os semi-tons, com os sons
ligados, a duração insuficiente do sopro, a falta de homogeneidade, a evidência
das passagens, dos registros.As dificuldades surgem pouco a pouco,
imperceptivelmente e após um período que parece normal, seguido de uma fase de
dificuldades crescentes, quando aparecem as alterações ou as lesões das cordas
vocais.
Os sinais que permitirão distinguir estas anomalias variadas são
os que o professor de canto escuta e vê.
Os problemas de timbre são tão numerosos que é preciso tentar
definir as suas causas. Estão entre elas:
a formação com esforço: órgãos contraídos, rigidez generalizada, pescoço
entumecido, veias salientes e menos freqüentemente a falta de tonicidade.
a posição anormal da boca, da língua, a articulação apertada, a mandíbula
contraída e o rosto crispado.
elevação ou abaixamento excessivo da laringe.
a má acomodação das cavidades supra-laríngeas ao som da laringe.
a respiração mal-feita e mal-utilizada.
Os problemas dos quais o cantor se queixa:
cansaço vocal, sensação de tensão interna excessiva, mal localizada na faringe,
sensação de comichão, de ardor ou de secura da garanta, a vontade de pigarrear
e mucosidades.
dor unilateral, incômodo para deglutir e crispações de um lado.
Finalmente, aquilo que o Laringologista constata:
O exame da laringe mostra problemas congestivos, após a repetição destes
traumatismos laríngeos que correspondem a erros de técnica. Inicialmente, as
cordas vocais se apresentam túrgidas depois elas se tornam rosadas e logo a
seguir vermelhas. A hiperemia passageira da mucosa desaparece após algumas
horas de descanso. Ela indica um desacordo entre o órgão vibrador - a laringe,
e o órgão ressonador - as cavidades supra-laríngeas. Estas incoordenações
motoras, que repercutem desfavoravelmente na emissão vocal, obrigam as cordas
vocais a um trabalho de suplência secundário.
Duas disodias importantes afetam os cantores de modo particular. São elas: a
monocordite e a hemorragia sub-mucosa. A primeira geralmente aparece após os
esforços vocais prolongados: cantar numa tessitura aguda demais, ou com uma
intensidade exagerada, ou trabalhar muito tempo as notas do extremo agudo, em
suma, trabalhar em excesso.
A hemorragia sub-mucosa aparece bruscamente, com tendência a reaparecer depois
de um esforço violento: notas agudas forçadas, sustentadas durante muito tempo
etc. Uma das cordas torna-se vermelha e a voz desaparece subitamente. Após um
repouso forçado, estas disodias regridem, mas voltam se as causas não são
suprimidas.
Um problema freqüente nos cantores é o nódulo ou nódulos de uma ou das duas
cordas vocais. Incontestavelmente este é o sinal de uma técnica errônea e de
esforços contínuos.
Como conseqüência das deformações, elas apresentam duas fendas glóticas. Disto
decorre um escape de ar que o cantor trata de compensar juntando-as fortemente,
senão a voz fica velada.
Ainda como conseqüência dos esforços vocais ou do cansaço excessivo, podem
ocorrer deformações das cordas vocais que influirão no fechamento glótico. Uma
das cordas ou as duas estão hipotônicas, ou não coaptam na parte posterior.
Elas estão flácidas e flutuantes. O movimento vibratório fica alterado e sua
amplitude diminuída. A voz é velada
GENERALIDADES
Dadas as conseqüências que podem intervir
sobre as cordas vocais, portanto sobre o rendimento vocal, é normal que os
cantores sejam informados que, como os oradores, eles estão à mercê das
perturbações funcionais ou orgânicas. Particularmente os esforços impostos aos
órgãos da respiração ou da fonação podem, com o passar do tempo, ou
bruscamente, ocasionar problemas orgânicos. Do mesmo modo as lesões ou
inflamações podem degenerar em problemas funcionais, que repercutem um sobre o
outro e se mantém mutuamente. Trata-se finalmente de um círculo vicioso do qual
só se pode sair tentando-se a lesão ou as inflamações bem como cuidando de
reestabelecer uma emissão fisiológica adequada, eliminando rapidamente os
problemas causados.
É preciso assinalar, também, que todo trabalho excessivo,
toda emissão ou respiração mal realizada, implica não somente na diminuição das
possibilidades vocais, mas também provoca a hipersecreção, isto é, muco, que
neste caso não desaparece apenas com tratamento local, mas sim pela aquisição
de uma técnica adequada.
Os cantores devem suspeitar de todas as infecções dos
órgãos supra-laríngeos (rinite, sinusite, faringite etc) mesmo temporárias, que
criam mucosidades que irão descer para a laringe e infectá-la, assim como as
obstruções ou desvios importantes das fossas nasais. Portanto tudo aquilo que
possa atrapalhar a respiração e a distribuição das zonas de ressonância. Todas
as condições que modificam as características acústicas do som, determinam as
dificuldades vocais e incitam ao esforço.
Esses fenômenos congestivos da faringe e da laringe devem
ser tratados, porque eles podem tornar-se crônicos, provocar tosse e pigarros
traumatizando, desta forma, as cordas vocais. Esses estados congestivos podem
provir dos brônquios ou dos pulmões e provocar mucosidades. Estas podem,
também, provir do tubo digestivo. Realmente, todas as alterações deste órgão ou
dos intestinos (úlceras, colite etc) podem levar a dificuldades vocais por via
reflexa. Reações vaso-motoras no nível das vias respiratórias aéro-digestivas
podem aparecer, assim como mucosidades criam um terreno favorável às lesões
inflamatórias. Além disso existirá também uma perturbação respiratória. Dada a
hipersensibilidade da musculatura abdominal, esta fica impedida de desempenhar
seu papel de sustentação o que reduz os movimentos do diafragma.
Progressivamente, a voz torna-se hipotônica e perde seu timbre, sua potência e
seu alcance.
Enfim é importante mencionar o que parece incompatível com
a carreira lírica:
As disarmonias importantes que não podem ser compensadas
pela técnica e que obrigam a compensações desproporcionais e raras, as quais
vão repercutir sobre a qualidade e a facilidade da voz, sobre sua extensão e
desta forma comprometer a carreira do cantor.
Todas as doenças pulmonares e cardíacas susceptíveis de
criar dificuldades respiratórias, uma falta de desenvolvimento torácico, uma
hipotonia, a fonastenia, um nervosismo excessivo, um desequilíbrio psicológico,
a saúde ou órgãos vocais frágeis, distúrbios digestivos, relaxamento excessivo
da musculatura abdominal, obesidade, uma eventração, asma ou enfisema.
As cantoras devem suspeitar dos problemas circulatórios
que podem determinar perturbações vocais importantes. Se a conexão vaso-motora
entre o órgão vocal e o órgão sexual está alterada o incômodo vocal se
acentuará na época da menstruação, principalmente se já existia antes. Além
disso haverá ainda a presença de mucosidades.
As doenças dos órgãos sexuais, assim como o período
menstrual alteram a voz, dá-se uma hipotonia. Durante a gravidez e na época da
menopausa, pode haver uma mudança de tom para mais grave e uma falta de
potência. Mas isto vai depender muito do estado geral de saúde. Certamente as
exceções são numerosas. Há mulheres que não apresentam estas influências na voz
durante este períodos, isto por que são equilibradas e têm os órgãos vocais em
perfeito estado, utilizando-os normalmente. É preciso considerar que a idade
real nem sempre corresponde à idade fisiológica. No entanto, é evidente que
para algumas mulheres as perturbações circulatórias ou problemas nos órgãos
genitais criam dificuldades passageiras: voz velada, baixa de tonalidade, a
ponto de não conseguirem arcar com seus compromissos.
Os tratamentos hormonais tornam a voz instável e provocam
uma baixa de tonalidade. As cordas vocais ficam rosadas e logo depois vermelhas
e podem apresentar edema, espessamento e coaptam mal.
As pessoas com hipertireoidismo apresentam períodos
passageiros de rouquidão, mas sempre recidivos. O timbre é ensurdecido, o agudo
torna-se difícil e muitas vezes o canto torna-se impossível. Nos casos de
hipotireoidismo, a voz é fraca, sem modulação e pouco timbrada. Acontece a
mesma coisa com os que têm uma hipo-função das glândulas supra-renais, que
devido à uma astenia têm pouca intensidade vocal e se cansam muito depressa. Ao
contrário, os que têm uma hiper-função das supra-renais possuem uma musculatura
potente, uma voz de grande alcance e bem timbrada.
Dada a importância do controle auditivo, toda disacusia
comprometerá gravemente a emissão vocal.
Portanto, em graus muito variáveis, todos esses distúrbios
podem repercutir desfavoravelmente sobre a voz, comprometer o rendimento vocal,
podendo levar a angústias graves do tipo obsessivo: medo do agudo, perda da
memória etc.
Nestas condições, fica muito difícil para cantor, dominar
o “trac” aquele que provoca os distúrbios fisiológicos: salivação excessiva ou
secura da garganta, transpiração, distúrbios da bexiga ou do intestino,
batimentos cardíacos etc. ou aquele que intervém em certos momentos ou frente à
certas dificuldades.
De todo modo, para sobrepujá-los, o melhor meio é ser
capaz de dominar sua técnica, mesmo nos momentos difíceis. A respiração pode
ser uma ajuda preciosa. Antes de entrar em cena, basta fazer algumas
respirações calmas e profundas, assim como nas pausas musicais suficientemente
longas, para restabelecer o ritmo cardíaco e desviar a atenção dos outros
problemas.
Disto tudo, devemos saber que para seguir uma carreira
lírica é preciso estar em bom estado geral e psicológico, além dos danos
necessários que são inatos. E dada a sensibilidade e a fragilidade dos órgãos
vocais e respiratórios é preciso abster-se de um certo modo de vida: evitar as
mudanças bruscas de temperatura, o ar condicionado, a umidade e especialmente
não fumar, nem beber álcool, não cantar durante a digestão e sempre que
possível ter um sono calmo e reparador. Praticar, paralelamente o treinamento
vocal e respiratório e se possível acrescentar exercícios de ginástica
corporal.
Evitar tudo aquilo que possa irritar as cordas vocais:
tosse excessiva, pigarreio freqüente etc. É preciso, também, evitar o uso
abusivo de medicamentes; gotas, gargarejos que no decorrer do tempo podem
provocar irritação. Desconfiar das cirurgias inoportunas das cavidades nasais,
a menos que a obstrução ou os desvios sejam importantes. No caso de infecção ou
hipertrofia das amígdalas, às vezes é necessário suprimi-las. Trata-se, não
somente, de um distúrbio importante no que diz respeito à distribuição das
ressonâncias, mas também na causa de esforços inúteis. No caso da remoção das
amígdalas, pode acontecer do cantor ser obrigado a reajustar sua técnica devido
ao aumento do volume da hipo-faringe.
Enfim, não acreditar que os medicamentos, as pastilhas, o
mel! ... e outros produtos sejam remédios eficazes. São paliativos que não
solucionam os problemas e que mantêm a hiper-sensibilidade do cantor.
O melhor meio de evitar as dificuldades funcionais e sua
repercussão é possuir uma boa higiene vocal, isto é, uma técnica impecável,
mantida regularmente, tanto da voz cantada como da voz falada. Os cantores
devem considerar tanto uma como outra e cuidá-las.
Classificar a voz falada é tão desastroso como classificar
a voz cantada. As conseqüências sãs as mesmas, elas são numerosas e às vezes
graves. Falar numa tessitura que não corresponda à sua classificação normal,
obriga as cordas vocais a um modo de vibração para o qual elas não são feitas,
a uma acomodação anormal das cavidades de ressonância, a um deslocamento do
tremor vibratório privando a voz falada da sua riqueza harmônica, ou seja das
suas qualidades estéticas e expressivas.
Há cantores que pensam resolver o problema do agudo,
cantando em mezzo sendo soprano, ou ainda os que cantam em soprano e falam em
contralto! Não há nada mais chocante para o ouvido do que escutar um cantor
usar sua voz cantada normalmente e falar com uma voz diferente. Só podemos
admitir uma razão para a baixa tonalidade da voz falada ou cantada, é a idade,
e isto varia de indivíduo para indivíduo. O agudo pode diminuir, a extensão
pode perde algumas notas, mas isto não se deve a uma mudança de categoria vocal
e sim à idade, quando o potencial muscular pode diminuir ou o estado geral mais
ou menos deficiente não permitir mais a tonicidade muscular necessária ao
extremo agudo. Porém, isto não implica de modo algum na mudança de tessitura da
voz falada ou cantada.
São numerosos os cantores que, após uma desclassificação
voluntária, tiveram que interromper uma carreira que teria podido prosseguir
por mais tempo, se, tivessem usado a mesma tonalidade para a voz falada e
cantada.